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08/11/2024 às 16:43, Atualizado em 08/11/2024 às 16:45

Consumo de carnes deve cair e pode impactar produção em Mato Grosso do Sul

Crescimento da alimentação à base de vegetais ganha força, e 20% dos brasileiros já evitam o consumo de carne

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Divulgação

Nos próximos dez anos, o tradicional prato brasileiro pode sofrer mudanças significativas: com o consumo de carne em queda, o setor produtivo de Mato Grosso do Sul se prepara para enfrentar novos desafios. Em um cenário de menor demanda interna por proteínas animais, a Embrapa alerta que a diminuição na procura por carnes pode afetar a dinâmica do mercado estadual e deve exigir adaptações na cadeia produtiva e estratégias voltadas a produtos de maior valor agregado.

Conforme o relatório “Projeções para o agronegócio 2023/24 a 2033/34”, elaborado pelo Mapa (Ministério da Agricultura e Pecuária), em parceria com a Embrapa, o consumo per capita de carne bovina no Brasil caiu para 24,2 kg em 2023, o menor nível desde 2004. A tendência de queda deve persistir na próxima década, especialmente devido a mudanças nos hábitos alimentares e ao impacto dos preços. Para Mato Grosso do Sul, essa realidade pode impor dificuldades, especialmente para a pecuária, um dos pilares da economia estadual.

“Se as tendências de redução no consumo de alimentos básicos, especialmente carnes, se confirmarem no Estado, isso pode representar desafios que impactariam tanto a dinâmica produtiva quanto o mercado local”, explica Rafael Zanoni Fontes, chefe adjunto de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Agropecuária Oeste. Ele acrescenta que a instituição está direcionando pesquisas para desenvolver soluções que ajudem Mato Grosso do Sul a se preparar para a adaptação à nova realidade de consumo.

Além das carnes, o arroz e o feijão, alimentos centrais na dieta brasileira, também demonstram quedas graduais de consumo ao longo das últimas décadas. A projeção para o arroz indica estabilidade na produção, mas queda per capita no consumo, enquanto o feijão, segundo estudo da UFMG, deve ser consumido com menor frequência pelos brasileiros a partir de 2025. Para ambos os produtos, a área de plantio pode até aumentar na próxima década, mas o consumo reduzido gera incertezas sobre a viabilidade de expandir a produção.

A despeito da queda de consumo, a produção de carne no Brasil está projetada para crescer, devendo alcançar 37,6 milhões de toneladas em 2033/34. Esse crescimento pode favorecer as exportações, que também têm projeções otimistas, mas, para o mercado local, a adaptação será essencial. “Esse cenário reforça a importância de estratégias voltadas aos novos padrões de demanda, explorando alternativas à produção pecuária e fortalecendo a posição de Mato Grosso do Sul no cenário nacional com produtos de maior valor agregado”, comenta Fontes.

Alimentação à base de vegetais

Fator que pode contribuir para a queda no consumo de carnes é o crescimento da alimentação à base de vegetais. Em 2023, dados da Ipsos, empresa especialista em pesquisa de mercado e opinião pública, apontam que cerca de 20% dos brasileiros agora evitam o consumo de carne, tendência que vem ganhando força desde 2020, quando apenas 4% dos brasileiros se identificavam como vegetarianos ou veganos. Especialistas observam que essa mudança nos hábitos alimentares é motivada pela maior conscientização sobre o impacto da carne na saúde, no meio ambiente e no bem-estar animal.

“A redução do consumo de carne, além de uma preocupação ambiental, tem sido associada a um cuidado com a saúde”, explica Julia Seibel, gerente de Parcerias Corporativas do EscolhaVeg. De fato, 82% dos entrevistados pela Ipsos apontaram a saúde como o principal motivo para a mudança nos hábitos alimentares, seguida por preocupações ambientais (49%), o sabor (48%) e a preocupação com os animais (42%).

Para a FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura), a produção de alimentos de origem animal é responsável por 14,5% das emissões globais de gases de efeito estufa, enquanto a produção de alimentos vegetais emite apenas 4% desses gases. Com isso, a tendência de buscar alternativas vegetais está se fortalecendo, tanto no mercado quanto entre os consumidores. Uma pesquisa da Ipsos também revelou que 68% dos brasileiros se mostram “favoráveis” a alimentos 100% à base de plantas, e quase metade (47%) já consome esses produtos regularmente.

Embora o número de pessoas que evitam a carne esteja em crescimento, há desafios práticos para expandir essa mudança. O preço elevado das proteínas vegetais é uma barreira para 70% dos entrevistados, enquanto 63% afirmam que a baixa disponibilidade de opções sem carne nos restaurantes afeta a adesão ao hábito. No entanto, a demanda crescente por alternativas vegetais abre um novo caminho para o mercado alimentar, com 54% dos brasileiros preferindo estabelecimentos que oferecem opções sem carne e 75% defendendo políticas econômicas sustentáveis.

A busca por locais com alternativas alimentares baseadas em vegetais não é uma tendência apenas nacional, mas também já reflete mudanças no consumo local. Beatriz Chen, proprietária do Broto de Bambu, um dos primeiros restaurantes vegetarianos e veganos de Campo Grande, está há 15 anos no mercado. Para ela, embora o aumento da demanda seja gradual, ele tem sido constante e revela mudanças na mentalidade do consumidor.

“Tem aumentado a procura de forma lenta, mas constante. O mais interessante é que muitos filhos, vegetarianos ou veganos, de pecuaristas trazem seus pais eventualmente para comer aqui. A primeira vez tem bastante resistência, mas na segunda, já não parece ruim comer de forma saudável durante a semana para ‘pisar na jaca’ no final de semana. Com o tempo, por nossa comida ser vegetariana e asiática, bastante única e autêntica, acabam gostando e se tornam clientes regulares”, explicou Beatriz.

Ela acredita que o crescimento da alimentação à base de vegetais deve uma combinação de fatores, mas destaca principalmente o desejo de experimentar algo novo. “As opções vegetarianas são bem acessíveis e se tornarão cada vez mais, por necessitar de menos energia e insumos para produzir”, comenta. Para Beatriz, além do interesse por uma alimentação mais saudável, o novo movimento é também uma busca por novas formas de pensar e consumir.

Por Djeneffer Cordoba

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