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20/07/2024 às 16:25, Atualizado em 20/07/2024 às 14:27

Planos de saúde cancelaram contratos de crianças autistas em Mato Grosso do Sul

As rescisões de contratos por parte dos planos de saúde virou alvo de investigação por parte da Senacon

Um levantamento feito pela Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) aponta 391 reclamações a respeito de rescisão de contratos sem solicitação ou aviso prévio, feito por parte dos planos de saúde no Brasil até maio deste ano. Em Mato Grosso do Sul, uma pesquisa feita pelo jornal Correio do Estado constatou que boa parte dos usuários que têm as assistências canceladas são crianças portadoras do espectro autista.

A Senacon relatou à reportagem que foram recebidas, através do canal ‘consumidor.gov.br’ apenas duas reclamações de rescisão de contrato em MS, sendo feitas em Dourados e Corumbá, contra as empresas nacionais Qualicorp Planos de Saúde e Seguros e AllCare Gestora de Saúde, no entanto, o Correio do Estado encontrou mais processos judiciais envolvendo essas instituições.

Apenas em Dourados, a AllCare possui cinco processos, todos movidos por responsáveis por crianças portadoras do espectro autista, que tiveram os planos cancelados. Em Corumbá, a reportagem encontrou um plano cancelado, de uma pessoa que estava em tratamento grave de saúde, necessitando inclusive de procedimento cirúrgico.

Já em relação a Qualicorp, foram encontrados dois processos em Dourados, referentes ao cancelamento de plano de saúde de uma idosa e de uma criança portadora do espectro autista.

CRIANÇAS

Em um dos casos, o pai de Carlos (nome fictício para proteger a identidade da criança), aponta que estava com as obrigações contratuais com a Unimed Norte de Minas, operadora de saúde, quando recebeu a notícia de que havia sido rescindido o contrato, um mês antes do prazo de vigência do plano.

No processo é relatado que “a notícia causou enorme espanto ao genitor do requerente”. A criança possui laudos médicos que afirma que não podia ter a interrupção do tratamento que fazia com psicoterapeuta, fonoaudiólogo, terapeuta ocupacional e apoio de professor em sala de aula.

“Portanto, a postura adotada pelas partes requeridas, configura-se como um verdadeiro ato de má-fé e uma tentativa desesperada de eximir-se de suas obrigações contratuais, devendo haver a intervenção do poder judiciário para garantir a preservação integral do vínculo contratual até a respectiva alta médica”, pontua o advogado do pai da criança.

Outro caso, José (nome fictício), de três anos de idade, foi diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista (TEA) e por isso precisa de acompanhamento neurológico e multidisciplinar, tratamento específico e indicado para crianças com esse diagnóstico.

No entanto, a responsável pelo menor entrou com processo na Justiça devido a AllCare e a Unimed Montes Claros Cooperativa Trabalho Médico pretenderem rescindir unilateralmente o plano de saúde do paciente, “deixando-o sem qualquer cobertura para procedimentos, consultas, exames e, mais grave, sem cobertura para as terapias que necessita com frequência e por prazo indeterminado”.

A responsável pela criança relata no processo que nenhuma informação foi prestada pela operadora, justificando a rescisão do contrato.

A Unimed Norte de Minas e a AllCare Gestora de Saúde cancelaram outros três planos de saúde de crianças com o espectro autista em Dourados. Até a publicação desta matéria, a AllCare não respondeu à reportagem a respeito dos casos de cancelamento das assistências.

Também em Dourados, a Amil Assistência Médica Internacional e a Qualicorp Administradora de Benefícios foram processadas por rescisão unilateral do contrato de uma paciente que foi diagnosticada com autismo infantil moderado e TEA. No processo, a responsável pela criança alega que os tratamentos prescritos para a paciente devem ser realizados de maneira contínua.

Em uma parte do documento é relatado que o contrato foi cancelado porque a Amil alega que a adesão entre a operadora e a Qualicorp vinha “gerando prejuízo acumulado, resultando em altos índices de reajuste, que ainda assim não foram suficientes para reverter a situação do contrato”.

Em nota, a empresa relatou que “na condição de administradora de benefícios, a Qualicorp informa que o plano de saúde da beneficiária (nome ocultado para preservar a identidade) está ativa no sistema da administradora. A decisão pelo cancelamento do plano é uma atribuição da operadora Amil, responsável pela cobertura assistencial.”

IDOSA

Também em Dourados, uma idosa de 86 anos, professora aposentada, relata que a Qualicorp é a responsável pela administração do seu plano e por realizar os descontos das parcelas em sua aposentadoria. No entanto, ao buscar realizar exames de rotina, a foi surpreendida com a informação de que seu plano de saúde havia sido cancelado.

“Sem entender o motivo, procurou a empresa Qualicorp, quando então tomou conhecimento do comunicado que a parcela do mês de dezembro não havia sido descontada em janeiro”, relata o processo.

Entretanto, a idosa alega que ao saber que a parcela não havia sido paga pela empresa, efetuou o pagamento e contactou a Qualicorp e a Bradesco Seguro, para comunicar o depósito.

As parcelas de janeiro e fevereiro foram descontadas normalmente pela Qualicorp, relata a aposentada, e mesmo assim, o seu plano de saúde permaneceu cancelado.

A professora esclarece ainda que não foi notificada de qualquer inadimplência, e que a Qualicorp enviou um comunicado à Universidade de São Paulo (USP), o qual ela foi docente, para informar que não houve o desconto no plano de saúde para os segurados, sendo relatada após o prazo previsto em lei.

Devido a uma série de problemas, como estes relatados pela reportagem, que são de pessoas de Mato Grosso do Sul, a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), que integra o Ministério da Justiça, tem questionado os planos de saúde a respeito de explicações do cancelamento dos planos de saúde, não só em MS, mas no Brasil.

Em matéria publicada pelo jornal O Estado de São Paulo, a Senacon alega que as respostas dos planos de saúde foram insuficientes, pois alegam apenas que os cancelamentos unilaterais não ocorreram de forma discriminatória ou direcionada a grupos específicos, e que boa parte ocorreu por inadimplência, no entanto, sem informar dados específicos e números solicitados.

As rescisões de contratos por parte dos planos de saúde virou alvo de investigação por parte da Senacon devido ao aumento de reclamações. Em 2023, a secretaria relata que teve 486 problemas reportados, e esse ano já chegou a 391 em cinco meses.

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