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15/02/2024 às 08:11, Atualizado em 15/02/2024 às 12:11

Justiça absolve nove acusados de desviar verbas públicas de diárias de viagens na Câmara de Rosana; só um ex-vereador é condenado

Sentença de primeira instância considerou que ‘a absolvição é medida que se impõe, dada a ausência de prova suficiente para a condenação’ dos réus da Operação Devassa.

Em sentença de primeira instância, a Justiça absolveu nove de um total de 10 réus que haviam sido acusados pelo Ministério Público do Estado de São Paulo (MPE-SP) de integrar uma associação criminosa dentro da Câmara Municipal de Rosana (SP) que tinha o suposto objetivo de desviar para proveito próprio verbas públicas de diárias de viagens do Poder Legislativo.

O único condenado pela decisão proferida pela juíza da Vara Única do Fórum da Comarca de Rosana, Camila Alves de André, foi o ex-vereador Walter Gomes da Silva pelo crime de peculato.

Os absolvidos foram quatro ex-vereadores, sendo um deles já falecido, quatro funcionários do Poder Legislativo e ainda a esposa do então presidente da Câmara Municipal à época da denúncia, conforme a lista abaixo:

Roberto Fernandes Moya Júnior, ex-vereador e ex-presidente da Câmara Municipal;

Aline Rosa Aparecida Moraes, esposa de Moya Júnior;

Cícero Simplício, ex-vereador, já falecido;

Filomeno Carlos Toso, ex-vereador;

Valdemir Santana dos Santos, ex-vereador;

Edison Alves da Silva, funcionário da Câmara;

Alan Patrick Ribeiro Correa, funcionário da Câmara;

Eduardo dos Santos Sales, funcionário da Câmara; e

José Francisco dos Santos, funcionário da Câmara.

Todos haviam sido denunciados pelo MPE-SP pelos crimes de associação criminosa e peculato, com exceção de José Francisco dos Santos, que ainda tinha sofrido também a acusação de prevaricação, em um caso que ficou conhecido como Operação Devassa, deflagrada há mais de oito anos, em janeiro de 2016.

Em relação a Cícero Simplício, a Justiça julgou extinta a punibilidade em razão de sua morte.

Ausência de prova suficiente para a condenação

A absolvição da maioria dos réus deu-se, segundo a sentença disponibilizada na última quinta-feira (8) no Diário da Justiça Eletrônico (DJE), em razão da “ausência de prova suficiente para a condenação” dos acusados.

“Em suma, não se logrou comprovar a prática dos delitos narrados na inicial em relação aos réus Roberto Fernandes Moya Júnior, Aline Rosa Aparecida Moraes, Cícero Simplício, Filomeno Carlos Toso, Valdemir Santana dos Santos, Edison Alves da Silva, Alan Patrick Ribeiro Correa, Eduardo dos Santos Sales e José Francisco dos Santos, e, em relação ao réu Walter Gomes da Silva, apenas restou comprovada a prática de um crime de peculato”, pontuou a magistrada.

“Assim, em relação aos réus Roberto Fernandes Moya Júnior, Aline Rosa Aparecida Moraes, Cícero Simplício, Filomeno Carlos Toso, Valdemir Santana dos Santos, Edison Alves da Silva, Alan Patrick Ribeiro Correa, Eduardo dos Santos Sales e José Francisco dos Santos, diante do requerimento formulado pelo Ministério Público, a absolvição é medida que se impõe, dada a ausência de prova suficiente para a condenação”, complementou.

Ainda de acordo com a decisão judicial, “o conjunto probatório é insuficiente para se imputar a prática dos delitos imputados aos acusados”.

“Verificada a inexistência de elementos coesos dentre as provas produzidas em juízo, não resta alternativa senão a absolvição dos réus acima mencionados. A condenação criminal só é cabível com provas seguras, consistentes, da materialidade e autoria do delito, sem o que deve prevalecer o princípio constitucional da presunção de inocência”, argumentou a juíza.

Para fundamentar a decisão, a magistrada destacou trechos do memorial elaborado pelo próprio Ministério Público, segundo o qual “o que consta da denúncia é apenas a alegação genérica da existência de quadro de irregularidades no âmbito das despesas com viagens da Câmara Municipal, sem a adequada especificação de condutas criminosas”.

“É certo, portanto, que, salvo a imputação de um crime de peculato feita ao réu Walter, as demais imputações não restaram demonstradas pelos documentos constantes dos autos ou mesmo pela prova oral produzida”, salientou a Promotoria.

O MPE-SP ponderou que “os elementos constantes dos autos evidenciam que não existia a situação de regularidade, probidade e excelência nas atividades desempenhadas pelos vereadores e servidores, como querem fazer parecer os denunciados”.

“Muito pelo contrário. Os elementos apontam para um cenário de dilapidação do patrimônio público generalizada, com seriíssimos prejuízos ao erário, tanto de maneira dolosa quanto de maneira culposa, por ineficiência e descontrole. Contudo, estes mesmos elementos não permitem concluir com o juízo de certeza necessário à condenação criminal que houve a apropriação de valores determinados em datas determinadas por agentes determinados por meio de condutas especificadas”, concluiu o MPE-SP.

Única condenação

O ex-vereador Walter Gomes da Silva recebeu uma pena de dois anos de reclusão, com regime aberto para o início do cumprimento, e multa no valor de R$ 262,66.

No entanto, a pena privativa de liberdade foi substituída pela prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas e ainda pelo pagamento de dois salários mínimos, o equivalente atualmente a R$ 2.824,00. Ainda segundo a sentença, o valor da prestação pecuniária será revertido em benefício de uma entidade pública ou privada com destinação social.

Segundo o MPE-SP, o então vereador deveria estar em São Paulo (SP) no dia 23 de abril de 2015. Contudo, há comprovante de passagem rodoviária saindo do distrito de Porto Primavera, em Rosana, às 19h30 da mesma data, o que impossibilitaria a chegada na capital paulista ainda naquele dia, conforme o Ministério Público.

A Promotoria relatou que o denunciado havia sido designado para sair de Rosana com destino a São Paulo no dia 22 de abril e retornar em 24 de abril.

Ainda segundo o MPE-SP, o protocolo do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP), que demonstraria o comparecimento do réu àquela repartição, é datado de 23 de março de 2015, às 12h36.

Por fim, conforme a Promotoria, a passagem de ônibus que seria referente à ida do denunciado a São Paulo era para a data de 23 de abril de 2015, às 19h30.

“Deste modo, é impossível que tenha efetuado o protocolo no Tribunal de Contas do Estado no dia 23 às 12:36, de modo que, quanto a esta conduta, ficou evidenciado que o agente recebeu os valores referentes às diárias, mas não viajou ou viajou apenas para dar justificativa à percepção do valor”, reforçou o MPE-SP, que defendeu a condenação do denunciado em relação a esse comportamento.

“Destarte, ante a coesão do conjunto probatório, a condenação do réu pelo crime de peculato é medida que se impõe”, sentenciou a juíza Camila Alves de André.

Outro lado

O advogado Luiz Infante, que trabalha na defesa do ex-vereador Walter Gomes da Silva, afirmou ao g1 na tarde desta quarta-feira (14) que irá recorrer da sentença que condenou o seu cliente.

“Eu vou recorrer sobre esta decisão, até porque todos foram inocentados. Acredito que foi um equívoco. Temos documentações que comprovam que foi uma decisão fora da realidade”, disse Infante.

Ele ainda salientou ao g1 que, psicologicamente, todos os envolvidos no caso foram “condenados”, mas não houve a comprovação do que realmente ocorreu.

“Houve fatos que foram retirados do contexto e ficou uma situação de que não mais se podia dar a resposta do outro lado. Porque, na verdade, houve um equívoco, mas, como houve uma grande divulgação, comoveu muito os eleitores, os políticos. Ficamos sem o direito de resposta”, concluiu Infante ao g1.

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