Publicado em 15/07/2024 às 13:06, Atualizado em 15/07/2024 às 12:14
Embora esteja com o passaporte apreendido, Bolsonaro afirmou, no sábado, que iria à posse de Tramp nos EUA
Aliados do presidente Lula (PT) temem que o atentado a Donald Trump, no sábado (13), reforce o discurso de que há perseguição contra a direita no mundo e fortaleça o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), atacado com uma facada na campanha presidencial de 2018.
Governistas também avaliam que o caso tende a aumentar a pressão contra o democrata Joe Biden e aproximar o candidato republicano da vitória nas eleições dos Estados Unidos.
Lula já declarou abertamente que torce pela vitória de Biden, tendo dito em junho que, se o adversário vencer, "a gente não tem noção do que ele vai fazer".
A comparação entre os ataques a Trump e a Bolsonaro foi feita pelo ex-presidente brasileiro e replicada nas redes sociais por diferentes aliados --como o filho mais velho, senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), e o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG).
A ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro foi uma das que postaram fotos do marido atingido pela facada em 2018 e do americano com sangue no rosto.
"Atentados são contra as pessoas de bem e conservadores", afirmou Bolsonaro neste domingo (14), ignorando outros episódios de violência política, como os tiros que atingiram dois ônibus da caranava de Lula, em 2018.
No sábado, logo após o crime, o ex-mandatário brasileiro chamou Trump de "maior líder mundial" e escreveu: "Nos veremos na posse".
Ele, porém, está com o passaporte apreendido por ordem do STF (Supremo Tribunal Federal).
O atentado contra o americano, uma espécie de ídolo político dele, ocorre em momento em que Bolsonaro sofre reveses no Judiciário --foi indiciado no inquérito que trata de joias recebidas pelo governo brasileiro e viu aliados serem alvo de operação da PF na última semana, sobre espionagem clandestina na Abin (Agência Brasileira de Inteligência).
Apesar do paralelo feito por bolsonaristas com o ataque de 2018, um aliado de Lula lembra que Bolsonaro foi hospitalizado após a facada e faltou aos debates presidenciais --diferentemente de Trump, que já recebeu alta.
Ele afirma que ainda é difícil medir o impacto do episódio na campanha americana e lembra que a esquerda e o centro conseguiram se unir e derrotar a ultradireita nas eleições legislativas da França, ao contrário do que previam analistas.
No Brasil, políticos de diferentes colorações partidárias descartam, porém, que o atentado contra Trump possa influenciar diretamente as eleições municipais, em outubro.
O senador Humberto Costa (PT-PE), coordenador do grupo de trabalho eleitoral do PT, afirma que o episódio não deve alterar a participação do presidente Lula na campanha deste ano, apesar da maior preocupação com segurança.
O petista diz que Lula estará presente na convenção eleitoral que vai oficializar a candidatura de Guilherme Boulos (PSOL) e Marta Suplicy (PT) à Prefeitura de São Paulo, no próximo sábado (20).
"Na verdade acho que haverá mais cuidados ainda [com a segurança]. Mas não creio que ele vá mudar de ideia em participar da campanha. Inclusive, ele já vai para a convenção do Boulos,", afirma Costa.
O presidente do PP e ex-ministro da Casa Civil de Bolsonaro, senador Ciro Nogueira (PI), também descarta efeito nas eleições de outubro. "Não acho que tenha impacto [no pleito brasileiro], já vamos ter uma vitória histórica", diz.
Para o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, o atentado de sábado vai ter influência nos Estados Unidos por causa da "maior revolta dos eleitores" de lá.
O presidente do Congresso, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), desejou rápida recuperação ao candidato republicano neste domingo e afirmou que outras tragédias vão acontecer, se não houver a busca pela "convivência pacífica e democrática".
Atos extremistas e violentos vêm se repetindo mundo afora, não só na esfera política, e uma reflexão urgente sobre esse estado permanente de ódio se impõe. Ou ampliamos a busca pela convivência pacífica e democrática, ou veremos outras tragédias acontecerem."
Já o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), afirmou pelas redes sociais que a Casa repudia com veemência qualquer ato de violência, como o sofrido por Trump: "As divergências se resolvem no voto da maioria e na vontade do povo".
Assim como o presidente Lula, integrantes do governo também repudiaram publicamente o ataque contra Trump.
A ministra do Planejamento, Simone Tebet (MDB), afirmou que toda violência política macula a democracia e deve ser duramente condenada.
"Minha solidariedade ao ex-presidente Trump. Que tristeza, mais esse episódio de violência contra um candidato no curso de sua campanha", declarou a ministra, candidata à Presidência da República nas últimas eleições.
Na mesma linha, o líder do governo Lula no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), afirmou que a violência contra Trump deve ser repudiada por todos os democratas do mundo.
"A política é e sempre será o espaço para o diálogo e a democracia. A violência em qualquer lugar contra quem quer que seja deve ser sempre combatida", declarou pelas redes sociais.
BOLSONARISTAS
Aliados de Bolsonaro, por sua vez, tentam usar o ataque a tiros contra Trump para reforçar a tese de perseguição contra líderes conservadores e lembram a facada sofrida pelo ex-presidente.
O discurso é similar ao que fazem para comentar investigações contra Bolsonaro, que se tratariam de uma atuação das elites política e jurídica que não aceitam as mudanças que ele teria implementado no país.
"A história se repete. Se não podem vencer, tentam matar. Trump irá voltar", escreveu nas redes sociais Jair Renan, um dos filhos do ex-presidente Bolsonaro, ao publicar uma montagem com a foto do pai e de Trump.
Os sete alvos são Mateus de Carvalho Spósito, Richards Pozzer, Marcelo Araújo Bormevet, Giancarlo Gomes Rodrigues e Rogério Beraldo de Almeida, contra os quais houve ordem de prisão e de busca; e José Matheus Sales Gomes e Daniel Ribeiro Lemos, alvos apenas de mandados de busca.
Entre eles estão um policial federal e um policial militar cedidos para a Abin e que atuavam com Ramagem. Os outros são influenciadores digitais que trabalhavam para o chamado "gabinete do ódio".
"Os investigados, segundo a Polícia Federal, participaram de uma estrutura espúria infiltrada na Abin voltada para a obtenção de toda a ordem de vantagens para o núcleo político, produzindo desinformação para atacar adversários e instituições que, por sua vez, era difundida por intermédio de vetores de propagação materializados em perfis e grupos controlados por servidores em exercício na Abin. O Relatório da Polícia Federal traz prova da materialidade e indícios suficientes dos graves delitos praticados", destacou o ministro em sua decisão.
A PF investiga se policiais lotados no CIN utilizaram o software de geolocalização e se produziram relatórios sobre ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) e políticos adversários do ex-presidente.
O objetivo seria desarticular a Abin paralela, organização criminosa voltada ao monitoramento ilegal de autoridades públicas e à produção de notícias falsas, utilizando-se de sistemas da agência.
Nesta fase, as investigações apontam que membros dos três Poderes e jornalistas foram alvos de ações do grupo, incluindo a criação de perfis falsos e a divulgação de informações sabidamente falsas.
Segundo a PF, a Abin Paralela também acessou ilegalmente computadores, aparelhos de telefonia e infraestrutura de telecomunicações para monitorar pessoas e agentes públicos.
Os investigados podem responder pelos crimes de organização criminosa, tentativa de abolição do Estado democrático de Direito, interceptação clandestina de comunicações e invasão de dispositivo informático alheio.
O CIN foi criado por um decreto de Bolsonaro, assinado em julho de 2020, que criou novas estruturas dentro do organograma da Abin, à época chefiada por Ramagem.
Durante as investigações, Ramagem negou irregularidades e afirmou, por meio de sua assessoria, que o "departamento de operações, composto exclusivamente de servidores de carreira da Abin, era o único responsável pela gestão, senhas e execução do sistema".
A justificativa para criação do CIN foi planejar e executar "atividades de inteligência" destinadas "ao enfrentamento de ameaças à segurança e à estabilidade do Estado" e assessorar órgãos competentes sobre "atividades e políticas de segurança pública e à identificação de ameaças decorrentes de atividades criminosa".
Servidores da agência e policiais federais próximos de Ramagem e da família Bolsonaro foram colocados em cargos de chefia na nova estrutura, o que fez com que o CIN fosse apelidado de Abin paralela.
O centro foi desmontado pela reestruturação promovida pela atual direção da Abin, já no governo Lula (PT), após a operação da PF que mirou o software espião.
O FirstMile foi utilizado pela Abin entre 2019 e 2021. Ele foi adquirido e ficava "hospedado" em computadores da Diretoria de Operações de Inteligência, mas depoimentos de servidores e documentos de apurações internas da Abin mostram o uso por solicitação de pessoas ligadas ao CIN.
O software de monitoramento foi produzido pela empresa israelense Cognyte —antiga Suntech/Grupo Verint. O FirstMile foi adquirido pela Abin ainda no governo de Michel Temer (MDB) por R$ 5,7 milhões.
Em decisão de janeiro deste ano sobre um servidor que foi alvo de busca pela PF, o ministro Alexandre de Moraes, que autorizou a operação, afirmou que ele era "o responsável pela fiscalização contratual do sistema FirstMile e, mesmo transferido de setor, continuou a realizar consultas pelo Centro de Inteligência Nacional."
"O servidor, ainda, tinha plena ciência da característica intrusiva da ferramenta que questionou, na condição de fiscal do contrato, o fato de a empresa fornecedora ter perdido a eficácia em relação a operadora Tim", dizia a decisão.
A Polícia Federal diz que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) tinha ciência da tentativa de venda do conjunto de joias ouro rosé em leilão que ocorreria no dia 8 de fevereiro de 2023 em uma loja nos Estados Unidos.
Segundo o relatório produzido pelo órgão, isso ficou evidenciado numa troca de mensagens entre Bolsonaro e o seu ex-ajudante de ordens, Mauro Cid, em que este manda um link de um leilão e o ex-presidente responde "selva".
"Selva" é uma forma de saudação comum no Exército, com um "ok" ou um "tudo certo", por exemplo, e que surgiu inicialmente em batalhões na Amazônia.
A PF relatou também que, durante a sua análise do celular de Bolsonaro, foram encontrados cookies e históricos de navegação da página da empresa Fortuna Auction, responsável pelo leilão.
Os cookies são arquivos que são trocados entre uma página da web e o navegador para facilitar o acesso e a trocas de outras informações.
"Esta sequência apresentada: primeiro, o envio de link do leilão por Mauro Cid, segundo, o registro de acesso à página por meio de histórico e cookies por Jair Bolsonaro, em seu aparelho telefônico, e terceiro, a utilização da expressão 'Selva' reforçam a utilização deste jargão para confirmar a ciência, do ex-presidente, de que o kit ouro rosé fora exposto a leilão", disse a polícia.
O kit rosé, segundo a PF, é composto por um conjunto de itens masculinos da marca Chopard contendo uma caneta, um anel, um par de abotoaduras, um rosário árabe e um relógio recebidos pelo então ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, após viagem a Arábia Saudita, em outubro de 2021.
A análise dos dados coletados pela PF no telefone celular de Mauro Cid revelou que o kit foi levado do país no final do mês de dezembro de 2022, por meio do avião da Presidência da República, e submetido à venda, em procedimento de leilão nos Estados Unidos.
A polícia ainda acrescentou que, no dia do leilão do kit rosé, Cid enviou ao contato do ex-presidente um link da rede social Facebook que provavelmente seria de uma transmissão ao vivo dos leilões da empresa Fortuna Auction e escreveu "daqui a pouco é o kit".
De acordo com a PF, como o item não foi arrematado, Cid enviou mensagens eletrônicas para a loja perguntando se o item poderia constar do próximo leilão e quais seriam os próximos passos a respeito do kit.
Porém, no dia 13 de fevereiro, Cid enviou um novo email à loja informando que o proprietário havia mudado de ideia e gostaria que o item fosse devolvido.
Segundo a PF, neste momento, o grupo estava preocupado em fazer com o kit voltar ao Brasil e solicitar que ele fosse enviado ao endereço onde residia o ex-presidente e seus assessores, em Orlando, nos EUA, o que ocorreu.
No dia 1º de março, Cid voltou a questionar a loja sobre quando iriam enviar o item de volta, numa espécie de "operação resgate", acelerada após reportagem publicada pelo jornal Estado de S. Paulo, em 3 de março, que revelou o caso.
O documento da PF também cita um depoimento do general da reserva Mauro Lourena Cid, pai do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, em que o militar afirma que entregou US$ 68 mil ao ex-presidente, de forma fracionada, pela venda de relógios recebidos pela Presidência.
O general disse que o seu filho solicitou que ele recebesse, em sua conta bancária nos EUA, os valores decorrentes de uma venda de bens de propriedade do então presidente. Em razão disso, ele teria disponibilizado sua conta bancária.
"O declarante disse que Mauro Cid relatou posteriormente que se tratava da venda de relógios de propriedade do então presidente Jair Bolsonaro. Ao ser questionado como se deu os repasses dos valores, Lourena Cid afirmou que os valores foram repassados de forma fracionada conforme a disponibilidade de encontros com o ex-presidente", disse.
Mauro Cid também afirmou, em depoimento do dia 28 de agosto de 2023, ter combinado com seu pai que o saque dos US$ 68 mil dólares, decorrente da venda dos relógios, ocorreria de forma fracionada e que os valores seriam entregues à medida que alguém conhecido viajasse dos Estados Unidos ao Brasil.
"O colaborador enfatizou que o dinheiro seria entregue sempre em espécie de forma a evitar que circulasse no sistema bancário normal", disse a PF.
(INFORMAÇÕES DA FOLHAPRESS)