Publicado em 02/08/2025 às 15:33, Atualizado em 02/08/2025 às 15:36

Mais de 8 mil mulheres pediram ajuda em MS, mas só 1 em cada 10 teve proteção garantida

Estado soma 20 feminicídios em 2025; mortes continuam mesmo após denúncias e medidas protetivas

Redação,
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Divulgação

Às vésperas do Agosto Lilás, mês de enfrentamento à violência contra a mulher, Mato Grosso do Sul confirma um número alarmante: 20 mulheres foram assassinadas em 2025 vítimas de feminicídio. O crime mais recente ocorreu nesta quinta-feira (31), em Ribas do Rio Pardo, e escancara a fragilidade da rede de proteção às vítimas. A professora Cinira de Brito, de 44 anos, foi morta a facadas pelo ex-companheiro, que a atraiu até sua casa sob pretexto de devolver objetos pessoais.

Cinira foi atacada com sete golpes de faca, na frente da cunhada com quem teria ido retirar os pertences. O autor, Anderson Aparecido de Olanda, tentou tirar a própria vida e morreu horas depois, já em Campo Grande. Em coletiva realizada ontem (1º), o Delegado Felipe Braga da Polícia Civil de Ribas do Rio Pardo confirmou que vizinhos apresentaram uma suposta carta deixada pelo feminicida contando sobre os motivos que o levaram a cometer o crime. O caso foi o 20º feminicídio registrado no Estado neste ano.

No mesmo dia, outro caso mobilizou as autoridades: o corpo de Angelita Rodrigues, de aproximadamente 50 anos, foi encontrado boiando no Lago dos Sonhos, no distrito de Culturama, em Fátima do Sul. Apesar da suspeita inicial de feminicídio, a Polícia Civil ainda apura se a morte foi criminosa ou acidental, já que a vítima sofria de transtornos psiquiátricos.

Proteção negada

O cenário é ainda mais grave quando comparado ao número de mulheres que buscaram ajuda da Justiça. Dados do Observatório da Cidadania da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul) revelam que, entre janeiro e julho de 2025, foram 8.992 medidas protetivas solicitadas no Estado. Apenas 849 foram concedidas — cerca de 9,4% dos pedidos.

A maioria ocorreu em Campo Grande, com 3.249 solicitações, das quais 406 foram deferidas. Em 2024, o contraste era outro: das 15.386 solicitações feitas em todo o Estado, 12.174 foram acolhidas pela Justiça — índice de 79%.

Procurada por O Estado, a Sejusp (Secretaria de Justiça e Segurança Pública) esclareceu em nota que a decisão de conceder ou não a medida cabe exclusivamente ao Poder Judiciário. “Quando a mulher procura alguma delegacia da Polícia Civil e denuncia algum tipo de violência doméstica e pede medida protetiva, a autoridade policial faz o pedido, que é encaminhado ao Judiciário, responsável por deferir ou indeferir”, informou.

Risco de morte maior

Enquanto isso, Mato Grosso do Sul segue entre os estados com maior taxa de feminicídios por 100 mil mulheres no país. Em 2024, a taxa foi de 2,4, quase o dobro da média nacional, de 1,4. Ao todo, foram 35 feminicídios no Estado no ano passado.

Esse índice coloca o Estado entre as unidades da federação com mais risco de morte para mulheres, superando estados mais populosos como São Paulo e Minas Gerais. No ranking nacional de 2024, 4 em cada 10 homicídios de mulheres tiveram motivação ligada ao gênero.

No país, foram 1.492 vítimas de feminicídio em 2024, o maior número desde a criação da Lei do Feminicídio, em 2015. Do total de 3.700 mulheres assassinadas, 63,6% eram negras.

Medidas descumpridas

Mesmo quando deferidas, as medidas protetivas nem sempre garantem a segurança da vítima. Dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública apontam que Mato Grosso do Sul teve 2.283 descumprimentos de medidas em 2023, o que coloca o Estado entre os 15 com mais violações. O número supera o registrado em estados como Ceará, Mato Grosso e Paraíba.

Em todo o país, mais de 100 mil medidas protetivas foram descumpridas em 2023, um aumento de 10,8% em relação ao ano anterior. Pelo menos 52 mulheres foram assassinadas mesmo sob proteção judicial ativa.

Quem foram elas?

Cinira de Brito é a 20ª vítima confirmada de feminicídio em 2025 no Estado. Antes dela, nomes como Karina Corim (Caarapó), Vanessa Ricarte (Campo Grande), Juliana Domingues (Dourados) e Emiliana Mendes (Juti) engrossam a lista de mulheres mortas por ex-companheiros, maridos ou namorados. Entre os casos mais chocantes está o de Vanessa Eugênio Medeiros, assassinada em maio junto com a própria filha, uma bebê de 10 meses.

A violência atinge cidades de todos os portes: de Campo Grande, Capital do Estado, a pequenos municípios como Cassilândia, Maracaju e Água Clara.

Confira a lista completa das vítimas de feminicídio em MS neste ano:

01 – Karina Corim (Caarapó) – 4 de fevereiro

02 – Vanessa Ricarte (Campo Grande) – 12 de fevereiro

03 – Juliana Domingues (Dourados) – 18 de fevereiro

04 – Mirelle dos Santos (Água Clara) – 22 de fevereiro

05 – Emiliana Mendes (Juti) – 24 de fevereiro

06 – Gisele Cristina Oliskowiski (Campo Grande) – 1º de março

07 – Alessandra da Silva Arruda (Nioaque) – 29 de março

08 – Ivone Barbosa (Sidrolândia) – 17 de abril

09 – Thácia Paula (Cassilândia) – 11 de maio

10 – Simone da Silva (Itaquiraí) – 14 de maio

11 – Olizandra Vera Cano (Coronel Sapucaia) – 23 de maio

12 – Graciane de Sousa Silva (Angélica) – 25 de maio

13 – Vanessa Eugênio Medeiros (mãe) – (Campo Grande) – 28 de maio

14 – Sophie Eugenia Borges (filha) – (Campo Grande) – 28 de maio

15 – Eliana Guanes (Corumbá) – 6 de junho

16 – Doralice da Silva (Maracaju) – 20 de junho

17 – Rose (Costa Rica) – 27 de junho

18 – Michely Rios Oruê (Glória de Dourados) – 4 de julho

19 – Juliete Vieira (Naviraí) – 25 de julho

20 – Cinira de Brito (Ribas do Rio Pardo) – 31 de julho

Por Suelen Morales