Publicado em 08/08/2022 às 06:30, Atualizado em 07/08/2022 às 17:03
A falta de orientação, de conhecimento e de acesso aos seus direitos constitucionais tornam as mulheres vítimas ainda mais vulneráveis
Em 7 de agosto de 2006, foi sancionada pelo então presidente Lula, a lei 11.340, conhecida como Lei Maria da Penha. Considerada um marco legal na criminalização da violência doméstica, a lei se tornou modelo para outros países e fez com que o Brasil reparasse, pelo menos em tese, uma injustiça histórica que permaneceu em silêncio por décadas.
O que antes era um problema de casal, num conceito errôneo de preservação da intimidade das famílias, se tornou o que de fato sempre foi: um crime, e a violência praticada contra a mulher deixou de ser considerada de menor potencial ofensivo.
Ao longo de 16 anos de intensos debates, e de uma mudança gradual e lenta da cultura de violência de gênero, a Lei Maria da Penha foi ganhando novos contornos no sentido de abranger, entre outras coisas, o que é a violência doméstica. O atendimento das mulheres vítimas de violência, e seus filhos, as medidas protetivas, as casas de apoio, a humanização do trabalho dos agentes públicos, maiores sanções para agressores e a tipificação dos diversos tipos de violência foram inseridos na Lei.
A primeira emenda à lei foi a 13.505/17, que estabelece que mulheres em situação de violência doméstica e familiar devem ser atendidas, preferencialmente, por policiais e peritos do sexo feminino. A lei também define ser direito da mulher em situação de violência a garantia de que ela, seus familiares e testemunhas não terão contato direto com investigados ou suspeitos de terem cometido a violência e pessoas a eles relacionadas.
A emenda 13.641/18, tipifica o crime de descumprimento de medidas protetivas de urgência. A norma estabelece que o descumprimento de decisão judicial pode ensejar na pena de detenção de três meses a dois anos. A emenda 13.772/18 é interessante porque tem a ver com a mudança de costumes e os novos comportamentos. Ela criminaliza o compartilhamento não autorizados de imagens (por foto ou vídeo) de nudez ou ato sexual e inclui esse ato como violência doméstica e familiar.
A hipótese de medidas protetivas de urgência também ficou garantida a partir da emenda 13.827/19, A norma também determina que seja feito o registro da medida protetiva de urgência em banco de dados mantido pelo CNJ. A Lei Maria da Penha só tratou da inclusão de mulheres com deficiência a partir da emenda 13.836/19, que torna obrigatória a informação sobre a condição de pessoa com deficiência da mulher vítima de agressão doméstica ou familiar.
Já as emendas 13.880 e 13.871, ambas de 2019, abordam maiores sansões aos homens agressores. A primeira prevê a apreensão de arma de fogo sob posse de agressor em casos de violência doméstica, e a segunda dispõe sobre a responsabilidade do agressor pelo ressarcimento dos custos relacionados aos serviços de saúde prestados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) às vítimas de violência doméstica
A reeducação de homens agressores só entrou em vigor em 2020, a partir da emenda 13.984/2020, que determina o comparecimento do agressor a programas de recuperação e reeducação; e acompanhamento psicossocial do agressor, por meio de atendimento individual e/ou em grupo de apoio.
E a pandemia causada pelo coronavírus fez surgir a urgência em determinar o atendimento às vítimas de violência doméstica como serviço essencial, garantido pela emenda 14.022/20.
Foi só em 2021 que o crime de violência psicológica no âmbito doméstico passou a constar no Código Penal, por meio da Lei 14.188. Com punição de seis meses a dois anos de prisão e multa, a emenda tem objetivo de garantir o afastamento imediato do agressor em caso de ameaça à integridade psicológica (e não apenas física, como a lei já previa).
A última emenda à Lei Maria da Penha foi publicada em 8 de março de 2022. De acordo com a Lei 14.310/22, fica determinado que o registro, pela autoridade judicial, das medidas protetivas de urgência deferidas em favor da mulher em situação de violência doméstica e familiar, devem ser feitos de forma imediata nos banco de dados mantido e regulamentado pelo Conselho Nacional de Justiça, garantido o acesso instantâneo do Ministério Público, da Defensoria Pública e dos órgãos de segurança pública e de assistência social.
Como se viu, os mecanismos legais de proteção e acolhimento das mulheres vítimas de violência domésticas são bem abrangentes e dão garantia jurídica aos processos. Mas essas legislações não são suficientes para diminuir os números. De acordo com o Anuário de Segurança Pública de 2021, 1 em cada 4 mulheres de 16 anos ou mais foi vítima de algum tipo de violência nos últimos 12 meses no Brasil, isso corresponde a 17 milhões de mulheres.
Quase a metade, 48%, foram agredidas e violentadas dentro de suas próprias casas e 32% não procuraram apoio em qualquer tipo de instituição. Só 12% das mulheres agredidas denunciaram a violência na Delegacia da Mulher e apenas 7% acionaram o 190.
Do universo de 17 milhões de brasileiras agredidas, 45% se mantiveram em silêncio.
A falta de orientação, de conhecimento e de acesso sobre seus direitos constitucionais tornam as mulheres vítimas ainda mais vulneráveis de agressores.
Em caso de violência, peça ajuda ou denuncie:
197 (Disque Denúncia da Polícia Civil)
180 (Central de Atendimento à Mulher)
190 (Disque Denúncia da Polícia Militar – em casos de emergência).