Publicado em 01/09/2024 às 17:00, Atualizado em 01/09/2024 às 15:10
Reportagem releva prática que infla ganhos de membros cortes superiores por meio de palestras
O Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS) gastou R$ 70 mil em duas palestras com membros de tribunais superiores no mês de maio deste ano. A informação foi revelada em reportagem do jornal Estadão sobre o "mercado de palestras" em que ministros do Supremo, STJ e TRT recebem até R$ 50 mil por palestras, criando uma forma de renda paralela, o que para alguns juristas distorce a lei e desrespeita à Constituição.
O teto de pagamento identificado pelo jornal, de R$ 50 mil, foi justamente o pago ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), André Mendonça. O ministro, que também integra o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), recebeu o valor de R$ 50 mil para dar palestra na abertura e no encerramento de um evento sobre direito eleitoral promovido pela Escola Judicial do Mato Grosso do Sul (Ejud-MS), órgão vinculado ao TJMS. O evento foi realizado parceria com a Ordem dos Advogados (OAB-MS) e o Tribunal Regional Eleitoral (TRE-MS).
Segundo o Estadão, Mendonça recebeu os R$ 50 mil por meio de sua empresa, a Integre Cursos e Pesquisas de Direito e Governança Global, o que reduziria os impostos a serem pagos por ele. Na ocasião, segundo matéria publicada no próprio site do TJMS, o ministro discursou para juízes, advogados e membros do Ministério Público.
No mesmo evento, o ministro Reynaldo Fonseca, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ganhou R$ 20 mil, também por meio de sua empresa, a SF Consultoria Acadêmica, Cursos e Eventos LTDA.
Prática é legal? - A reportagem traz diversos outros exemplos da contratação de ministros e desembargadores por meio de empresas do setor privado, de órgãos públicos e de entidades representativas, como os conselhos.
A lei proíbe aos magistrados exercer qualquer outra função que não seja o “magistério”, ou seja, dar aulas, isso para evitar conflitos de interesses. Já a Lei Orgânica da Magistratura (Loman), permite aos juízes, desembargadores e ministros manter atividades empresariais, desde que não administradores, mas sim apenas sócios cotistas.
Porém, em 2016, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) equiparou a realização de palestras à atividade de professor, abrindo a margem para a escalada dessa atividade.
Segundo professor de direito constitucional, Conrado Hubner Mendes, da Universidade de São Paulo (USP), que foi ouvido pela reportagem do jornal paulista, há conflito de interessa nesta prática.
“Mesmo que (esse ofício) não fosse remunerado, há uma questão enorme de conflito de interesses real, objetivo e potencial porque esses eventos, em geral, são disfarces para lobby. Isso é muito elementar. Quando tem remuneração, você adiciona uma camada de problema. Quando não tem transparência na remuneração, adiciona uma segunda camada. Quando se faz por meio de pessoa jurídica, tem uma terceira camada e todas elas, obviamente, violam a Constituição”, afirmou.
O TJMS foi procurado, mas não respondeu aos questionamentos do Estadão.