O Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (Imasul), por meio da Procuradoria-Geral de Mato Grosso do Sul (PGE-MS) comportou-se divergente ao pedido de indenização de uma aposentada de 62 anos de idade, moradora de Campo Grande, que mantinha em casa, há 22 anos, o "Guri", um papagaio, que foi apreendido, e logo morreu no CRAS (Centro de Reabilitação de Animais Silvestres).
Maria de Lurdes Ferreira, assim que teve o papagaio apreendido, alegou ter sofrido questões de saúde, tentou reaver o bicho, não conseguiu e resolveu mover ação judicial em que pede R$ 80 mil de indenização do Estado.
A PGE é a instituição que defende o Estado na esfera judicial.
A aposentada disse ter ganhado "Guri" de um amigo da família. O animal foi apreendido, segundo a Polícia Militar, porque uma pessoa denunciou anonimamente que "Guri" era maltrado na casa da aposentada, situada no Jardim Panorama, em Campo Grande. Maria de Lourdes negou que judiava de Guri, pelo contrário.
Sustentou a aposentada: "é [papagaio] como seu filho, integrante da família há muitos anos, onde passa maior parte do tempo com este papagaio servindo de terapia para a mesma, uma vez, que é hipertensa, já sofreu parada cardiovascular e tem depressão, tomando para vários medicamentos, conforme farta documentação probatória (atestados, receitas, laudos médicos e fotos de remédio)".
DISCÓRDIA
No entanto, conforme trecho da apelação do PGE, a versão da aposentada é contrariada.
Parecer clínico assinado pelo veterinário Lucas Cazati, produzido no dia da apreensão do papagaio, em 28 de julho de 2019, diz:
1 - O animal chegou com escore corporal baixo, indicando subnutrição e/ou nutrição inadequada. Apresenta também inapetência e comportamento de debicagem [estresse crônico].
2 - Apresenta alterações macroscópicas nas fezes, sugestivo de endoparasitose [relacionada com problemas de manejo, higiene, nutrição, genético, ambiente inadequado].
3 - Sistema músculo/esquelétrico: aumento moderado nas articulações inferiores.
4 - Pele e anexos: penas opacas e com coloração anormal, indicando possível hepatopatia [doenças crônicas do fígado]: presença de linhas de estresse sugestivo de problemas nutricionais, narina com aumento de massa [hiperqueratose]; nódulo lateral direito localizado no pescoço, sugestivo de lipoma [espécie de tumor, mas benigno].
MORTE
Em seguida, segundo o laudo, o animal estaria recebendo cuidados, "sendo submetido a exames complementares de imagem laboratorial, para que possamos proporcional uma terapia adequada".
No entanto, os cuidados não adiantaram. "Guri" morreu 28 dias depois de apreendido. A aposentada tentou, judicialmente, retomar o papagaio menos de uma semana depois da apreensão. Pelo anotado no processo da questão, a aposentada foi avisada que bicho tinha morreu um ano e sete meses depois. Papagaio vive até 60 anos.
REVÉS
A PGE incluiu em sua defesa trecho da Lei Federal 5.197/1967, que diz:
"determina que todo animal silvestre é propriedade do Estado. Portanto, é ilegal a posse por particulares desses animais, sem origem comprovada".
A procuradoria contesta, ainda, a forma como a defesa da aposentada, no processo, trata o episódio como "apreensão do papagaio".
"Houve resgate de animal silvestre e não apreensão", sustenta a procuradoria.
A PGE "pede que os pedidos em desfavor do Estado de MS [indenização] sejam julgados improcedentes" e sugere, ainda, que o Ministério Público seja informado para "apuração do crime ambiental praticado pela autora".
O QUE DIZ A DEFESA
Gil Antônio Advocacia, que defende a aposentada contestou apelação da PGE, desde o laudo que apontou a condição física do papagaio, quando apreendido.
Ele cita, inclusive, trecho do boletim de ocorrência anotado pelos militares que apreenderam "Guri".
"Não foi constatado pela guarnição maus tratos da ave e também não estava na gaiola, estava solta e dentro da casa".
Destacou, ainda, o defensor: "a interatividade do animal com a requerente, sempre foi constante, eis que o papagaio, sempre estava alegre na convivência da casa, cantando, assobiando e chamando a requerente de mãe, sendo o centro das atenções de toda a família".
A aposentada ganhou o papagaio de um amigo, que já morreu, ainda "filhote, sem penas, trazendo todas as felicidades que o mesmo trouxe ao seu lar, aos longos destes mais de 22 anos", diz outro trecho da defesa.
Narra, também o defensor, que "embora o animal seja silvestre e protegido pela fauna brasileira, fato este que não é negado pela autora, a questão que deve ser apreciada é referente a domesticação da tese referente ao direito constitucional do meio ambiente ecologicamente equilibrado".
Depois da apreensão, mencionou o advogado, a aposentada ficou debilitada, caiu numa crise "depressiva, hipertensão, descompensação diabética".
Afirmou também o defensor: "a depressão afeta não só as pessoas que possuem a posse desses animais, como no caso da requerente, mas também o animal, que acaba não se alimentando, não tendo os cuidados necessários e de costume, ficando complementamente desolado".
Na apelação da PGE, é dito que "a casa da família da autora [aposentada], por mais acolhedora que tenha sido, era um cativeiro. Ainda que o afeto pela ave tenha sido genuíno, o animal foi retirado da natureza de modo inapropriado e impedido de viver livremente, reproduzir e contribuir para a diversidade da fauma nacional".
Advogado que defende a aposentada assim manifestou-se:
"A guarda doméstica sem fins lucrativos ou comerciais não caracteriza cativeiro. Por mais rigorosos que sejamos, a criação caseira de animais silvestres é um hábito cultural, onde a posse dos "louros" é tida como hábito e tradição comum, utilizada pelas populações como elemento constitutivo da própria cultura acumulada através dos tempos, portanto, não há agressão direta ao meio ambiente em determinados atos como a criação doméstica de papagaio único".
O advogado pede que a contestação da PGE seja "impugnada, requerendo, desde já, que sejam ratificados os argumentos explanados na peça inaugural pórtica, sendo julgada totalmente procedente a ação".
Isto é, quer a defesa que siga o pedido da aposentada, que corre na 1ª Vara de Fazenda Pública e de Registros Públicos de Campo Grande.
Com informações do Correio do Estado
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