Fazendeiros e moradores do Pantanal insistem em que os produtores rurais não são os culpados pelo fogo que se alastra pela região. Com 415 bombeiros militares mobilizados para combater as chamas que tomam conta da vegetação desde abril, produtores confirmam que estão sendo extremamente prejudicados.
Gilson Barros, Presidente do Sindicato Rural de Corumbá, destacou em entrevista ao Jornal O Estado que as autoridades estão colocando a culpa nos trabalhadores rurais, o que ele considera como um grande equívoco.
“O pantaneiro odeia o fogo fora de época, afinal seu gado não se alimenta de cinzas. Tínhamos a cultura de queimar macegas após as chuvas umedeceram as matas e o solo em geral proporcionando uma queima pontual e controlada de material desprezado pelo gado e por toda a fauna de herbívoros do Pantanal, assim, sendo queimadas essas macegas seriam consumidas após a rebrota e não serviriam de bucha para incêndio no próximo período seco”, pontuou.
Barros continua dizendo que diversas multas já foram distribuídas com um discurso de ódio a qualquer tipo de fogo, inviabilizaram as queimadas preventivas e expuseram o bioma aonde a pecuária não está sendo tocada de forma mais intensa, aos incêndios florestais.
Por isso, ele alega ainda que é preciso medidas preventivas e mitigatórias para proteger as áreas onde o gado não pasta, área como as reservas ambientais, parques, beira de rios e regiões que acumulam muita matéria seca.
“O mundo já conhece técnicas preventivas, como queima controlada em quadrantes, criação de herbívoros, aceiros de grande porte, trituração de material de alto poder de combustão etc para mitigar o material combustível. O fogo sempre existiu no Pantanal, algumas plantas necessitam de fogo para quebrar a dormência de suas sementes e ou aumentar seu florescimento (pirófilicas), o que precisamos não é imaginar um Pantanal sem fogo, e sim um Pantanal sem incêndios florestais”, completou.
O fazendeiro Armando Lacerda também conversou com a reportagem do jornal O Estado e explicou sobre os pontos críticos que tem encontrado durante os sobrevoos realizados diariamente na região de Corumbá até Porto São Pedro. Ele cita que todos os focos estão próximo a fronteira com Mato Grosso, ressalta que a margem do lado direito do Rio Paraguai está praticamente destruída.
“Partes que estavam sendo recuperadas foram danificadas pelo fogo novamente. Temos um grande foco de incêndio no lado do castelo que está subindo para o norte muita fumaça e ar carregado. Além do fogo no parque nacional do Pantanal. Esperamos que logo venha uma chuva para resolver essa situação que se alastra”, reforçou.
Na última segunda-feira (24), a ministra do Meio Ambiente Marina Silva já havia adiantado que as queimadas eram fruto de ação humana. “Não tem incêndio por raio, o que está acontecendo é ação humana. Está nas mãos das pessoas evitar que isso continue se alastrando”.
Nesta sexta-feira (28), o governador Eduardo Riedel recebe representantes do Governo Federal em Mato Grosso do Sul, incluindo as ministras Marina Silva (Meio Ambiente) e Simone Tebet (Planejamento e Orçamento), e o secretário-executivo do MDR, Valter Ribeiro de Moura.
Após a chegada prevista para âs 9h em Corumbá, integrantes da comitiva embarcarão em uma aeronave para um sobrevoo na região pantaneira. Logo depois vão visitar as instalações do PrevFogo (Ibama) e seguem até o Quartel do Corpo de Bombeiros onde será montada uma sala de situação para monitoramento dos focos de incêndio com a coordenação do Governo de MS. A reunião está marcada para às 11h.
Quase 95% dos focos de queimadas foram em propriedades privadas
De acordo com o monitoramento do programa BDQueimadas, do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisa Espacial), quase 95% dos focos de incêndio no Pantanal, no primeiro semestre deste ano, foram em propriedades privadas. Com a situação pior que 2020 e com, pelo menos, mais três meses de estiagem, nesta quinta-feira (27), o Governo do Estado vai apresentar os relatórios de trabalhos e investimentos para o combate ao fogo semanalmente, por lives abertas ao público.
Conforme o relatório do Inpe, que usa tecnologia de satélites de diferentes instituições, apenas 189 pontos de ignição (início das chamas) foram registrados em terras indígenas e unidades de conservação, estaduais ou federais. O mês de junho deste ano já é o com mais focos de incêndio de toda a série histórica do Inpe, que faz esse monitoramento desde 1998.
Outro ponto de destaque, levantado pelo laboratório de satélites ambientais da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), é que menos de 1% de todos os focos de calor detectados pelos satélites da federal tiveram raios como origem. Apenas os meses de janeiro, fevereiro e abril tiveram algum incêndio que, de acordo com o monitoramento, começou em razão de causas naturais — o que indica que 99% foram por ação humana.
Para o diretor executivo do SOS Pantanal, Leonardo Gomes, é urgente e de extrema importância a realização de investigação, fiscalização e perícia para identificar e responsabilizar os causadores destes focos que foram responsáveis por enormes áreas queimadas. “A ação de poucas pessoas tem o poder de destruir áreas muito grandes, como visto nas regiões próximas ao Rio Paraguai em Corumbá, especialmente, um dano pelo qual todos nós pagamos”, afirma Gomes.
Durante a coletiva de lançamento da plataforma de dados sobre incêndios florestais no Pantanal, promovido pela Secretaria de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação, o governador Eduardo Riedel (PSDB), reforçou que o empenho para atender a demanda é gigantesco e que não cogitaram a possibilidade de ajuda do exterior. É importante lembrar que o Corpo de Bombeiros já usa satélites internacionais para monitorar as queimadas.
“A ajuda é muito bem-vinda. O Governo Federal já enviou brigadistas, equipamentos e aeronaves, mas recursos ainda não. Nós estamos pedindo também apoio de outras naturezas, a ajuda internacional ainda não veio de nenhuma espécie e não foi solicitada”, destacou o governador.
Riedel também lembrou que desde abril estão empenhados nas estratégias de prevenção e, agora, se faz necessário levar a informação do que está sendo feito para todos os sul-mato-grossense. “Muita coisa é falada sem informação ter chegado e por isso nós estamos aqui. É importante esse tipo de atitude nossa aqui, para dar transparência, abertura, conhecimento e até sugestões de críticas, orientações que o pormenor alguém possa ter em relação ao trabalho feito. Quando eu falo de desinformação, é nivelar esse conhecimento e é de toda a natureza”, destaca.
A tenente-coronel Tatiane Dias, responsável pelo CPA (Centro de Proteção Ambiental), apresentou algumas estratégias de trabalho. “Nós temos aqui um número calculado de 2024, de 1º de janeiro a 25 de junho, de 530 mil hectares atingidos pelas chamas. Isso reflete que o cenário é bem mais crítico do que em 2020, porém a nossa estrutura já está muito maior e organizável”, pontua.
Já Jaime Verruck, responsável pela Semadesc, reforçou que enfrentamos eventos climáticos extremos desde o começo do ano, que impediu até a queima preventiva das matérias orgânicas – principal material combustível dos atuais focos de incêndio. “Nós instituímos a queima prescrita, foi identificado todas as propriedades rurais que tinham biomassa. Mas a ação foi paralisada em função das condições climáticas. Então, nós retornamos, nós voltamos, não fazemos mais a queima prescrita. Porque a possibilidade de nós sermos um indutor no processo existente seria muito elevada”, explicou.
Mato Grosso do Sul já empregou R$ 50 milhões em equipamentos e ações de prevenção e combate aos incêndios florestais no Estado, contando por exemplo, com duas aeronaves Air Tractor que podem lançar 3 mil litros de água, cada. Além disso, foi feita a aquisição de novos equipamentos e veículos para auxiliar os bombeiros.
Por Thays Schneider e Kamila Alcântara
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