A guerra entre a Rússia e a Ucrânia deve reduzir a rentabilidade da agricultura brasileira neste ano.
Se de um lado os dois países são importantes produtores mundiais de grãos, como trigo e milho, respectivamente, e os conflitos devem diminuir a oferta mundial desses itens e pressionar os preços, de outro os custos de produção da agricultura, que vinham subindo, devem aumentar ainda mais.
A Rússia é o segundo maior produtor e exportador mundial de nitrogênio e o terceiro maior em fósforo e potássio, insumos básicos para a formulação de fertilizantes.
Além disso, o aumento do preço do petróleo afeta um custo crucial no campo: o do óleo diesel usado para mover máquinas e no transporte das cargas.
Entre grãos, algodão e lavouras permanentes, como café, cana e laranja, o lucro líquido dos agricultores brasileiros, descontados impostos e despesas financeiras, deve atingir neste ano R$ 25 bilhões.
Seriam R$ 20 bilhões a menos do que o obtido no ano passado (R$ 45 bilhões), nas contas do economista Fabio Silveira, sócio da consultoria Macro Sector.
Esse lucro menor esperado para este ano deve ocorrer mesmo com receita nominal recorde projetada em R$ 1 trilhão.
Nessa estimativa, o economista considera as pressões de custos advindas do conflito entre Rússia e Ucrânia, como a alta do petróleo e dos fertilizantes.
"Antes da eclosão da guerra, a rentabilidade já seria menor, pois o custo vinha subindo."
Para chegar a essa cifra, ele considerou avanços de um dígito nos preços dos grãos, que já estão hoje em patamares elevados.
A perspectiva é de que, com a alta dos juros nos Estados Unidos, os investimentos especulativos de fundos em commodities devem migrar para a compra de bônus do Tesouro americano.
Com isso, os preços das matérias-primas cotadas nas Bolsas internacionais perdem impulso, explica Silveira.
"O balanço entre custo e receita não é favorável ao produtor brasileiro, porque os preços da soja e do milho não terão uma elevação que compense o aumento de custos dos insumos."
Nova safra
Por conta da forte pressão de custos turbinada pelo conflito, Guilherme Bellotti, gerente da consultoria Agro-Itaú BBA, diz que as margens dos agricultores na safra 2022/2023, que começa a ser plantada a partir de outubro deste ano, devem ser menores do que as registradas na safra 2021/2022.
"A rentabilidade deverá ser menor, a menos que tenha um impulso muito grande nos preços das commodities", afirma o analista.
Mas, assim como Silveira, ele ressalta que o patamar de preços das matérias-primas agrícolas hoje já está num nível elevado, e ele projeta a manutenção desse nível.
Custos
"Um dos maiores impactos que a guerra tem sobre a agropecuária brasileira é em relação ao aumento de custos de produção", afirma Bruno Lucchi, diretor técnico da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).
"20% do NPK (nitrogênio, fósforo e potássio) que o Brasil compra vem da Rússia", diz.
Ele observa que, como esses produtos já vinham aumentando de preço, muitos produtores haviam optado por adiar, para o segundo trimestre, a compra de adubo para a safra que começa a ser plantada em outubro.
A expectativa era de que os preços dos fertilizantes recuassem no período.
No entanto, com a guerra, o quadro mudou.
"O produtor está revendo a sua estratégia, e terá de buscar fornecedores confiáveis que garantam a entrega do fertilizante no segundo semestre, quando ele for plantar. Além do risco de desabastecimento que passou a existir, os custos podem subir ainda mais."
Outro custo importante para a economia e em especial para agricultura é o dos combustíveis.
Com o barril de petróleo acima de US$ 100, o preço do diesel tende a subir. "A agropecuária está no interior e as distâncias são grandes, o que afeta o custo do frete e do escoamento da produção", diz Lucchi.
Ele lembra também que muitos defensivos usados nas lavouras têm como matéria-prima básica o petróleo, o que significa mais pressão de custos.
O dólar, que vinha perdendo força em relação ao real antes da eclosão do conflito, é outro fator que coloca mais pressão nos aumentos de despesas no campo.
Com o aumento da incerteza, o câmbio voltou a subir e grande parte insumos da agricultura é dolarizada.
Conteúdo - Estadão
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