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09/10/2016 às 19:00, Atualizado em 09/10/2016 às 18:31

Urnas deram mandato de vereador para 12 índios em MS este ano

Da lista, duas são mulheres.

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Arquivo Midiamax

Mato Grosso do Sul elegeu, no último domingo (2), 12 vereadores indígenas. Representando, ao menos, duas etnias, como a Terena e a Guarani Nhandeva, os novos parlamentares simbolizam para muitas comunidades uma esperança no avanço de políticas públicas e a introdução de assuntos deixados de lado pelos 'brancos'.

Os 12 eleitos, no entanto, também serão observados de perto pelas comunidades, que já declararam que devem acompanhar a atuação dos parlamentares. Os parlamentares foram eleitos em Amambai, Caarapó, Dois Irmãos do Buriti, Japorã, Miranda, Paranhos, Sidrolândia e Tacuru.

Alécio Soares (PSDB) 41, foi eleito em Caarapó – distante cerca de 270 quilômetros de Campo Grande -, com 627 votos, o 8º mais votado dos 11 vereadores eleitos no município. Natural da reserva Tey kue, Alécio é professor.

“Agora, com a visão que a gente está, a gente percebe que precisamos de um representante. É isso que a comunidade vem percebendo. A cada quatro anos tem troca de vereador, quando elege o cidadão, ele tem que mostrar a sua habilidade como parlamentar. Eu fui muito vitorioso porque eu já sou da área da educação e nesse trabalho as pessoas vem percebendo como eu sou”.

Alécio afirma que a escolha pelo partido não se deu pelos mesmos motivos que, segundo ele, permeiam as escolhas de legendas por pessoas não indígenas. “Eu como pessoa, como cidadão brasileiro, e nós povos indígenas, pra mim, pra minha pessoa partido não é tão importante, porque o que depende é a pessoa fazer um bom trabalho para os povos indígenas”, afirma, complementando que o fato do governador pertencer à legenda, pode motivar mais diálogo.

Questionado sobre as 'retomadas' – ocupações de terra motivadas pela demora nos processos de demarcação -, Alécio responde que analisa a questão 'pelos dois lados', mas que entende a realidade vivida pelos índios em Mato Grosso do Sul.

“A questão da retomada eu acho que sou novo nessa área, mas o que eu percebo, que já vem há anos, é que o culpado nesse meio todo é o governo federal, eu não acho que é a comunidade indígena ou os povos brancos. Eu acho que é direito da população indígena. E eu acho que o governo tem que resolver a questão”, defende.

Uma das lideranças da terra recém 'retomada' - onde o último episódio sangrento do conflito de terras culminou com o assassinato do agente de saúde indígena, o Guarani e Kaiwoá Clodiode Aquiles Rodrigues -, Elson Canteiro Gomes, 28, Guarani e Kaiowá que participa de outras instâncias políticas, como o Aty Guasu – conselho político dos kaiowá -, enxerga a eleição de forma positiva, mas também, de forma crítica.

“Pra gente, um vereador indígena tem que representar e defender uma causa na Câmara, Tem a questão da educação, da saúde, não importa onde a comunidade esteja localizada, na reserva, terra demarcada ou na retomada, no meu entendimento esse é um representante, o vereador é elegido pelo povo, queremos que ele represente”, afirma.

Elson discorda um pouco de Alécio quanto às legendas. Para o kaiowá, que também é professor, há partidos que atuam, em totalidade, contra a causa indígena. “No meu ponto de avaliação, primeiro eu avalio os projetos que chegam até a comunidade indígena e quais seriam os partidos que atendem a demanda. Quando eu fui dialogar com ele eu falei assim, o que significa esse partido? Nem todos políticos defendem a causa”, afirmou. Elson, ainda assim, pretende acompanhar e desenvolver projetos junto ao parlamentar. “Nós vamos trabalhar, afinal nossa comunidade precisa de apoio, afinal, como professor, eu vejo que o povo precisa de mim”.

Mulheres eleitas

Entre os 12 vereadores, duas mulheres foram eleitas. Adelina Amurilio (PRP), 38, foi a terceira vereadora mais votada na cidade de Japorã, onde se elegeu em uma Câmara com nove parlamentares, entre eles mais um indígena, Joaquim Adiala Hara (PRP). Adelina trabalhava na Sesai (Secretaria especial de saúde indígena) como agente de saúde. Além de Adelina, Luzia Montiel (DEM) foi eleita em Tacuru com 230 votos. Na cidade, um dos únicos parlamentares eleitos pelo PT no Estado, o índio Valino Goulart Gomes foi o 3º mais votado.

Leila é uma das mulheres líderes da retomada da terra Ivy Katu – território Guarani e Kaiowá que já foi declarado, mas não homologado -, na região de Japorã. Ela vê a eleição de mulheres como uma conquista, mas afirma que, até hoje, vereadores indígenas que já foram eleitos, não vão à comunidade apresentar projetos.

“Porque aqui já teve dois homens e não fizeram nada. Foi quatro já, inclusive uma mulher casada com branco, ganhou mas não fizeram nada. Seria importante se elas soubessem levar a coisa, fazer projeto pra nós aqui. Eu esperava que, como mulher, que soubesse falar, andar atrás da coisa, pra buscar. Não sei e ela vai fazer alguma coisa ou não”, afirma Leila.

“Nós indígenas, se não souber levar, falar, sair buscando recurso, a gente não está com nada. Estava pensando, essa mulher que ganhou aqui, nunca trouxe nada, nem um pedacinho de projeto. Eu não sei o que vai acontecer, mas desejo que ela coloque projeto pras mulheres, pra trabalhar, porque a gente precisa de uma vereadora competente”, complementou.

O jornal Midiamax tentou conversar com as duas vereadoras mas elas não atenderam as ligações.

Estratégia política

Em Sidrolândia, distante cerca de 65 quilômetros da Capital, dois indígenas Terena foram eleitos. Cledinaldo Marcelino Cotócio (PROS) e Otacir Pereira Figueiredo (PROS), conhecido como gringo. Cledinaldo foi reeleito com 508 votos. O Terena de 32 anos era trabalhador rural e afirma que seu mandato deve ser direcionado ‘tanto pela cidade quanto pela aldeia’.

“O partido está unido agora, e no que for pra direcionar para as questões indígenas a gente vai direcionar, tanto pela cidade quanto pela aldeia”, afirmou. Questionado sobre as retomadas, ele afirmou que “na verdade a parte que eu mais atuei foi na questão do conflito de terras, onde eu pude ajudar a ser um apaziguador, quando eles ocupam as fazendas, eu ajudo a transferir o gado”.

Cledinaldo, no entanto, também afirmou, sobre as terras que “na região de Sidrolândia já se tem o suficiente”. “Essa questão da saúde, junto com o gringo eu vou tentar correr atrás disso, reforçar a questão do plantio, é o que a gente quer orientar, porque na verdade eles ficam meio perdidos nessa parte nas terras”.

Sobre o partido, Cledinaldo afirma que “precisava ficar num partido que fosse mais tranquilo”. “Eu precisava me candidatar em um partido com estabilidade. O PROS fez três [vereadores] em Sidrolândia, eu brigo pela presidência da câmara”, declarou.

Lindomar Terena é ex-presidente do DSEI-MS (Distrito Sanitários Especial Indígena de Mato Grosso do Sul) – órgão da Sesai -, e um dos nomes de ‘peso’ do Conselho Terena – conselho de deliberação, parecido com o Aty Guasu para os Kaiowá -. Ele explicou que eleger vereadores foi uma das pautas discutidas pelas Assembleias Indígenas. A estratégia política tinha o objetivo de eleger 20 vereadores, 10 no norte do estado e 10 do sul.

“Tudo que se espera é que possa representar da melhor forma possível a sua comunidade. Eu penso que todo vereador indígena que for eleito, deve ter como bandeira principal a defesa dos direitos dos povos indígenas, a gente falou isso pra vários candidatos. Um vereador pra governar ele tem que trazer os projetos, já teve vereadores que não conseguiram corresponder às expectativas por ter se ficado distante das comunidades, das mulheres, da juventude. Eu acho que ele tem que manter o pé no chão, saber que ele não vai fazer milagre, mas se tiver uma boa participação com as comunidades, termos condições”, explicou.

Agora, os conselhos preparam-se para realizar um seminário com os vereadores indígenas.

“Na verdade nós tínhamos um desafio nas nossas assembleias, de que o conselho terena esperava que fossem eleitos 10 só na região norte, e na região sul outros 10. Pra você ter ideia, aqui no município de Miranda nós tivemos vários candidatos, nós temos condições de fazer 4 vereadores, um de cada comunidade, mas quando lança 20, 30, candidatos acaba perdendo as chances”, avaliou Lindomar.

Vereadores

Em Amambai foi eleito o Professor Ismael (PMDB); em Caarapó o Professor Alécio (PSDB); em Dois Irmãos do Buriti, Eder Alcântara de Oliveira (PSDB) e Eber Reginaldo Vitorino (PSDB); em Japorã, Professor Joaquim (PRP) e Adelina (PRP); em Miranda Adilson Antonio (PSL); em Paranhos, Cleber Valiente (PSDB); em Sidrolândia Cledinaldo Marcelino Cotocio (PROS) e Otacir Pereira Figueiredo (PROS) e em Tacuru, Valino Goulart Gomes (PT) e Luzia Montiel (DEM).

Fonte - Midiamax

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